Pacote

Entrei no meio da fumaça cinzenta, sempre a fumaça. Lúcio estava ali, tentando vencer o torpor da garrafa de uísque ordinário. Perguntou se era eu e minha resposta foi irônica: E se fosse outra? Disse-me que deixasse de bobagem e olhou pra mim como se me visse de fato. Pode ser até que me tenha enxergado bonita, mas o que lhe causou impressão foi minha cara séria; percebeu que eu tinha um assunto muito grave a tratar, gravíssimo. Sentei-me à sua frente, sem tirar a capa de chuva e os pingos de água caíram no tapete, mas isso ele nem percebeu. Vesti uma voz muito calma e disse: Troque a bebida por um pedaço de chocolate aerado, daqueles que derretem na boca. Apenas constatação, apesar de ele ter entendido isso como censura, pois retrucou que ao menos tinha o pudor de confessar que a bebida lhe fazia falta. No entanto, percebendo a parede no fim do beco sem saída, tentou corrigir, dizendo que lhe fazia falta, pois vivia entre pessoas omissas, com aquele jeito covarde e acuado que eu não aguentava mais. Então tirei da minha bolsa Louis Vuitton o pacote retangular, cuidadosamente embrulhado e com o selo do correio, e larguei-o sobre a mesa. Ele arregalou os olhos e perguntou o que era aquilo, mas antes de suas pálpebras se fecharem para entender o que estava acontecendo, eu já estava na porta. Deixei-o com seu delírio. O de sempre.

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