domingo, 27 de março de 2011

Bambinas


Meninas são como caquis: amadurecem precocemente e de um dia para o outro viram outras meninas, cheirando a tinta nova.


Teodora tinha quase três anos quando Carmela chegou. Era daquelas crianças que comiam verdura e não sabiam o que era coca-cola; pra ela só suco natural fatta dal papa. Estava sempre com ele, com quem aprendia a sorrir com os olhos e se admirar até no espelho das poças de água nos dias de chuvarada. Con il nome di questo, mia bambina será uma executiva seriíssima, vocês vão ver, e Teodora ria e ria, colocando nas bochechas aquelas covinhas irresistíveis.


O nome de Carmela não tinha sido escolha do pai devotado. Carmela? Carmela não! Suggerisce chamariz de amantes enlouquecidos, e fazia gesto de beijo na boca, imaginando Carmela fatal, de mão na cintura. No entanto, Carmela vingou; com seus cílios longuíssimos, estava sempre dependurada nos livros, desde muito cedo, e parecia uma espécie de porcelana bojuda prestes a se espatifar. Adorava Teodora e tutte le masse, mas imitava-a até dizendo gostar de chicória, só para receber uma aprovaçãozinha em forma de sorriso da irmã mais velha. Além disso, nunca se interessou em falar italiano, deixando o privilégio dos mimos paternos para Teodora: ciò sì tirato me, claro que puxou a mim; também con questo nome!


Tanta coisa flui pelo cordão umbilical e se decifra lentamente! O tempo passou como sempre, e o papa de Carmela e de Teodora adquiriu até uma certa barriguinha que o impedia de ver os pés, de tanto vinho e coisas tais. Carmela ficou uma mocinha meio baixa e roliça, com bochechas rosadas, mas sem covinhas; mais tarde, advogada de família temida nos tribunais ao defender as causas das mulheres frustradas em seus casamentos desastrosos. Fluente em francês e italiano, atravessava o oceano e mudava de hemisfério com seu porte de mulherzinha esculpida por Botero.


Teodora carregava os sons no corpo e o perfume de almíscar nos cabelos encaracolados e brilhantes. Alta e longilínea, continuou admirando-se pelo mundo afora: brilhava nas passarelas de Milão e endoidecia tantos pares de olhos quantos coubessem nas covinhas de suas bochechas maquiadas.


Seu papa virou seu empresário e grande enólogo frequentemente visto nos trajetos de primeira classe Brasil-Itália. De fato, ninguém resiste ao feitiço de uma filha; ainda mais de una bambina chamada Teodora!


21 comentários:

  1. Pergunta é: quem é a mais feliz?
    Nina

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  2. Seu blogue é muito lindo! Parabéns!

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  3. Nina:
    Dúvida enorme, não é? Não sei mesmo...
    Beijo


    Carol:
    Fico feliz de que tenha gostado. Seja sempre muito bem-vinda!
    Beijo

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  4. Ternura de niños cálida, bella imagen y texto mi querida amiga Teresa feliz semana para ti mi estimada amiga, gracias por compartir tu escrito.

    Mil gracias por tu huella amiga en mujeres heroínas.

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  5. "parecia uma espécie de porcelana bojuda prestes a se espatifar"... Que imagem bonita! Dá ideia de muita presença na vida, com todos os perigos...
    Um beijo.

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  6. Quer me parecer que cada uma delas encontrou seu caminho, caminho traçado desde seus verdes anos... Tão diferentes um do outro como o eram as irmãs entre si... Coisas da vida...
    Beijos e um bom dia, Maria Teresa.

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  7. Um pai assim faz toda a diferença na vida de uma filha ou de um filho. Gostei da história, tão verdadeira. E tudo de bom pras duas!
    Beijos pra você.

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  8. Pergunta de tostines: o que veio primeiro o feitiço da filha ou a filha do feitiço?!

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  9. Eu sempre fui muito diferente da minha irmã,
    e continuamos a ser. Mas há sempre algo que
    nos une. Gostei deste post.
    Bj.
    Irene

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  10. Um belo retrato das duas bambinas. Pude vê-las na tela, cada qual com sua beleza e seus dilemas. Das duas, as duas. Parabéns, Maria Teresa.

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  11. Ma:
    Bom vê-la aqui! Obrigada pela visita carinhosa.
    Beijo



    Nivaldete:
    Fico feliz de que tenha gostado; você sabe quanto valem para mim suas ponderações relativas à estrutura, ao jogo com as palavras.
    Beijo



    Dulce:
    Às vezes é difícil acreditar como caminhos que começam no mesmo ponto se tornam às vezes até paralelos, sem vínculo...
    Beijos


    Dade:
    De fato, pais assim são seres iluminados...
    Beijo pra você


    À Italiana:
    Como saber, não é? Nem fazendo enquete...
    Beijo


    Irene:
    São os tais laços invisíveis, que têm força e sedução; não há quem os defina, porque são coisas de alma.
    Beijo


    Marcelo:
    São lindas mesmo, ainda bem que você conseguiu vê-las assim.
    Grande abraço

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  12. Maria Teresa
    Duas irmãs tão diferentes, como acontece em muitas famílias.Deu-me a sensação que, até em relação ao pai, havia uma preferida, o que também acontece nalguns casos. Ambas seguiram caminhos distintos. Teodora uma vida de "glamour" acompanhada pelo pai, Carmela dedicou-se à justiça. Será que se sentiu injustiçada, pelas diferenças físicas da irmã que idolatrava e de tratamento por parte do pai?
    Fico a refletir...
    Beijos
    Lourdes

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  13. Que vontade de ganhar uma beijoca bem mmolhada daquela boqui8nha travessa! Nada como uma ou dujas lindas bambinas!

    Bj Ruth

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  14. Que pena... postei minha resposta no dia em que vc mandou o email. Fui verificar agora, depois que vc mandou a mensagem, e percebi que não saiu...rsrsrsrs O que eu disse foi: AINDA BEM QUE O "GAETANO" NÃO ENTROU NESSA ESTÓRIA, HEIM!!!!!!!!!! Beijo grande. RIT@

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  15. Lourdes:
    Você enxergou-as no fundo das entrelinhas; saber disso me deixa realizada!!
    Beijos

    Ruth:
    São cativantes, né?
    Beijos

    Rita:
    Morri de rir depois que descobri que Gaetano era esse!!!
    Beijos

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  16. Olá querida Maria Teresa,
    Filhos dos mesmos pais, mesmo ambiente, mesma educação e as derivações são sempre óbvias...Os papeis inverteram-se, nada é previsível!..
    Beijinhos,
    Manuela

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  17. Manuela:
    Se houvesse manual de instruções, seria tão mais simples... A vida gosta mesmo de umas cambalhotas...
    Beijo carinhoso

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  18. Este texto deu que pensar e me levou até às minhas cinco filhas que como os dedos de uma mão estão ligados entre si, mas nenhum é parecido com o outro e cada qual melhor se adapta a cada circunstância a que é submetido. Assim são elas!

    Kandandos e um óptimo fim de semana.

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  19. Kimbanda:
    É por isso que os enredos da vida são fantásticos, não é? Tudo fora de nossas perspectivas, de nossos pontos de vista, mesmo que muitas vezes as pessoas nos tragam algumas frustrações. Além de grandes alegrias, claro.
    Abraço grande

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  20. As histórias dos anônimos são mais parecidas com as nossas próprias.

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  21. Ara K. Ju:
    Sem dúvida; a ficção nada mais faz que buscar inspiração na realidade tão rica de personagens. Verdadeiros.
    Abraço

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