segunda-feira, 21 de março de 2011

Cópia?


“Não existe mau marido, não se esqueça que mesmo não sendo um marido bom, ele fez de você uma mulher casada.” Essa foi a cereja do bolo, a participação sensacional da garçonete da cidadezinha nos confins da Toscana, que vira a mesa e o entendimento linear do espectador do novo filme (Cópia Fiel, na tradução em português) do diretor iraniano Abbas Kiarostami. Lá o casal ou pseudocasal “discute a relação” e o escritor ídolo debate sobre o real e o simulacro com sua fã de carteirinha. Ou não. Afinal, de nada se tem certeza. Ou não. James Miller (William Shimell) é o escritor inglês, que fica conhecido ao lançar seu livro Copie Conforme, premiado na Itália como o melhor estrangeiro do ano. Elle (Juliette Binoche) é a leitora que, impossibilitada de assistir à sua palestra, na Itália, convida-o a dar um passeio; as vidas dos dois, paralelas, interceptam-se de uma maneira, que se transformam em cópias daquilo que vivemos aqui conforme. O cenário paradoxal da paisagem romântica de Lucignano e seu cotidiano monótono com mulheres empurrando carrinhos de bebê fazem o espectador remexer-se na cadeira, tentando encontrar posição mais cômoda ou deixar de olhar para a tela quando os closes enormes das caras dos personagens incomodam. Da mesma forma causa desconforto, um pouco antes, a estrada tortuosa e linda ladeada de ciprestes, quando o carro passa por ela em grande velocidade, como se a vida estivesse acontecendo ali e naquele momento para embaralhar o estômago e os filosofismos simples. O escritor famoso é marido rabugento e vice-versa. A admiradora do escritor é mulher bonita que faz perguntas como: “você se lembra do hotelzinho onde passamos a lua de mel?”, e vice-versa. Cópia conforme o que acontece na grande maioria dos lares, cópia conforme os valores mais importantes da Arte aos olhos de quem a vê do que propriamente de acordo com seus ‘andaimes do edifício’, no dizer de Bilac. Por que o Davi de Michelangelo lá da Accademia, em Firenze, tem mais valor do que o Davi da Piazza Signoria, para quem o admira da escadaria da praça? De fato, “não há nada de simples em ser simples”; a vida é assim, mascarada de simplicidade. Réplica? Isso é o que menos importa.

(imagem: http://pt.wikipedia.org/wiki/David_)

3 comentários:

  1. Ser marido é um emprego a tempo inteiro. É por isso que tantos maridos fracassam: não conseguem dedicar a isso toda a sua atenção...

    Beijo.

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  2. Olá Maria Teresa,
    Não vi ainda este filme, mas empurrou-me para a sala de cinema, o que é preciso é que apareça por cá!
    Ficou aqui a bulir «não há nada de simples em ser simples»...porque tornamos a vida sempre tão complicada?
    Beijos,
    Manuela

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  3. Manuel:
    Taí uma bela definição! Gostei!
    Abraços


    Manuela:
    E vai ficar a bulir depois do filme, você vai ver. É daqueles em que se fica pensando e pensando e tudo parece ser coerente. Eu gostei.
    Beijos

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