Era uma vez
um atrevimento em forma de prega. Instalara-se ali com aquela audácia dos que
chegam, acomodam-se e ficam para sempre. Não era única, isso sabia que não; era
previsível também que se misturasse a tantas outras já mais antigas, já mais
vincadas e profundas, no entanto, sentia que sua juventude velha no meio das
demais lhe daria um ar de curiosidade franzida com cheiro de coisa nova. Daí a
estupefação que causou. Ainda atordoada por tanto burburinho, esboçou um
alongamento de músculos e encolheu-se, bem na hora em que Marina se olhou no
espelho redondo, aquele de aumento, usado para maquiagem ou correção das
sobrancelhas. Foi seu momento de glória! Glória efêmera, todavia! Isso porque uma
ruga, por mais vigor e despreparo que apresente, é sempre ruga inconveniente, outorgada
a toda pele mais cansada, mais afeita a movimentos rotineiros sempre os mesmos,
sempre os mesmos. Por isso que o que se viu a seguir, com o pasmo reconhecido
das outras rugas, mais sisudas e bem fincadas ao redor dos olhos, ao lado da
boca e no alto da testa foi digno de uma crônica e de uma página musical e de
uma tela de pintor: Marina olhou para a novata, esticou-a, como se não
acreditasse no que via e fez aquela cara doce, própria de quem ri com duas covinhas
na bochecha há mais de cinquenta anos. Então
a ruga corou de vergonha e definhou no instante mesmo em que surgiu. E Marina riu
de novo e de novo e mais ainda ao perceber que sua risada tornava a prega coisa
à toa, traço quase invisível no de fora, diferente do de dentro, bem vincado,
amadurecido, sedutor.
(imagem: http://www.google.com.br)
Bom dia, Maria Tereza!!!
ResponderExcluirTudo bem?
Que texto lindo para reflexão! Nos faz ver que, apesar de indesejáveis, as rugas podem ter maior ou menor importância dependendo de como nos colocamos diante destas cicatrizes do tempo.
Grande abraço!
Limara:
ResponderExcluirelas são inevitáveis, mas significativas, não é? E demandam outra espécie de alinhavo...
Beijo carinhoso
O que mais gostei foi o final, onde você compara a ruguinha à toa de fora com os vincos de dentro. Texto maduro, reflexivo, primoroso. Você se supera a cada nova lavra, Maria Teresa. Parabéns.
ResponderExcluirOutro texto muito bom, Maria Teresa. Muito fiel à realidade, como você costuma produzir.
ResponderExcluirBeijo!
Obrigada, Marcelo. É um prazer enorme encontrá-lo por estas bandas, com toda sua gentileza. Grande abraço.
ResponderExcluirDade: muito obrigada. A realidade é pródiga de estímulos, não é? Beijos
ResponderExcluirMuito sábia essa Marina! Ri porque sabe que essa ruguinha nada mais é do que um passo em um caminhar pela vida entre momentos intensos, colhendo dores e amores, alegria e lágrimas, experiências e frustrações, enfim, nada mais é do que um sinalzinho de que a vida segue em frente inexoravelmente e que é preciso saber colher cada momento desse caminhar...
ResponderExcluirLindo texto, minha amiga!
Beijos e um bom dia para você.
Dulce: a colheita é proporcional àquilo que se aprendeu, claro que é. Agradeço muito esses seus comentários que tornam sempre muito ternos meus momentos de "colher".
ResponderExcluirBeijos
É claro que "rugas" podem ser "psicológicas""! O bom humor, a aceitação da vida com todas as suas nuances, tornam mesmo esse "probleminha" de efeito menor. Se me encaro com alegria e felicidade,não há rugas que intervenham em minha disposição. O que vale é o que sou e o que sinto...
ResponderExcluirBj RUTH
Ru:
ResponderExcluirpalavras sábias, como sempre. Bjos