sábado, 19 de setembro de 2009

Meteorologia

Chuva garota. Caía timidamente e mal molhava as pedras endurecidas pela aridez do tempo e de todos aqueles nervos ressequidos. Era morna, inconsistente, ávida por tornar-se um temporal arrasador, memorável.
O solo seco rejubilava-se com aquele sopro úmido; o tédio enfurecido da rotina cinzenta tingia-se de um colorido suave e a chuva menina salpicava aqui e ali com graça e ternura, seguindo o curso do destino a ela confiado.
Era esperada há muito. Ele sabia necessitar daquele afago e saiu pelas ruas empoeiradas a seu encontro. Reconhecia-se incompleto, incompetente. Lágrimas redondas misturavam-se ao tênue sussurro dos sutis respingos de encantamento daquela chuva ainda virgem de maus presságios.
Foi quando tudo se transformou. Invadiu-o uma tempestade de partículas de pó ainda mais ressequidas, e seu ódio tomou gigantescas proporções. ZAP! Era só voltar a seu cotidiano regrado, esquecer a chuva agora já não tão plácida. Não havia necessidade de lavar o chão de sua alma, de limpar os vidros de sua imaginação embotada. As palavras continuariam ali, fechadas em seu comodismo peculiar, acostumadas que estavam à pequenez de seu empenho e de seu engajamento.
Doce martírio. Desencadearam-se e fluíram aquelas palavras febris, quebrando as vidraças, saltando para fora e apreciando com sofreguidão o cheiro de terra molhada. Nada mais as deteria. Nuvens e mais nuvens maciças contorciam-se no céu, flores brotavam no asfalto e a chuva, finalmente adquiria feições sensuais e irresistíveis.

2 comentários:

  1. Maria Teresa,
    obrigada pelo convite.
    Foi muito bacana "ouvir" o sentimento brotando,as palavras fluindo soltas, sem dono, sem rumo.
    Parabéns!
    Um abraço, Flávia.

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  2. Seja bem-vinda, Flávia! Será um prazer encontrá-la por aqui! Abraços.

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