sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Toada

A despedida foi como das outras vezes: olhos inchados, mãos cheias de saudade antes mesmo de partirem. O voo estava atrasado, afinal caía um dilúvio, e os últimos dez minutos tiveram aquele gosto casto de eternidade. Cada um seguiu seu rumo não só com a promessa de cartas cotidianas, dessas que agora existem o tempo todo nas pontas dos dedos, mas também com o compromisso de uma surpresa grandiosa, após aqueles que seriam os seis mais longos meses de suas vidas. E como as coisas sonhadas só têm o lado de cá, um pensou no outro com paciência, amou o sonho do outro, o perfume do outro, o calor do outro, pois assim eram eles, nem parecia que de fato eram daqui (ou parecia?). Novamente o voo atrasou, afinal lá tinha havido uma nevasca, e os primeiros dez minutos do reencontro tiveram aquele sabor ácido de coisa desafinada: ele voltara trinta quilos mais magro, menos intelectualizado, mas preocupadíssimo com seu índice de massa corpórea; ela tingira o cabelo de ruivo, trocara o jeans pelo salto alto e concluíra o primeiro semestre do curso de Mestrado. E porque as coisas reais só têm o lado de lá, a despedida foi bem diferente: os olhos ficaram foscos e as mãos, cheias de alívio, antes mesmo de acenarem meio constrangidas, com aquele gosto lúbrico daquilo que é efêmero, provisório.

9 comentários:

  1. OI Maria. Acho que esse moço precisa de uma enfermeira urgentemente. 30 quilos é muita coisa! Muita mesmo. Cuidados emergenciais e intensivos!
    :)

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  2. Olá, Maria Teresa!

    Muito obrigada pelo convite para visitar teu blog! Gostei muito da tua forma de escrever!

    Vi que você também escreve hai-kais!rsrsrs

    Parabéns pelo conto, e pelo blog também!

    Uma beijoca,

    Neli

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  3. Caro Anônimo:
    O pior é que a ficção inspirou-se na realidade! Ouvi outro dia, na Band News, a história de uma pessoa que viajou por 6 meses e surpreendeu a noiva no momento do desembarque!
    Abraço.

    Oi, Neli:
    Agradeço seu passeio por aqui, no meio de meus botões. De fato, adoro hai-kais e vou logo conhecer os seus. Apareça!
    Beijo pra você.

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  4. Amiga Teresa,

    Amo o que escreve!
    Resumindo, longe da vista, longe do coração.
    Triste história, sobretudo agora que leio o seu comentário que diz ter sido inspirada por uma história real.

    Beijinhos

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  5. Olá, Maria Teresa!

    Tem uma escrita linear com um conteúdo virado para o fim triste, longe das histórias de encantar, sem que o principe encantado dê um beijo na bela adormecida!

    Se vê como positivo este meu comentário, digo-lhe que é um texto muito bom!

    Renato

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  6. Você sempre muito querida, Fernanda!
    Pois é, torcemos sempre por um happy end nem sempre possível na vida real; triste mesmo (apesar de que, na história real, não sei exatamente o que houve depois do susto do reencontro)!
    Beijos,
    MTeresa

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  7. Renato:
    Obrigada pelo comentário. Histórias de príncipes encantados povoam nosso imaginário, mas outras histórias de pessoas comuns povoam nosso cotidiano, sem o brilho de tronos e coroas. E a vida segue seu curso de forma natural... É assim mesmo, não é?
    Abraço.

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  8. Curto demais o que e como você escreve. Parabéns, querida! Beijos

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  9. Oi, Tânia: sua visita carinhosa sempre traz expectativa da outra e da outra...
    Beijos

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